
A empresa Águas de Reúso de Vitória, que está pleiteando a construção de uma estação na Serra para reciclar esgoto de Vitória e vender como água de reúso, defende que a medida vai ajudar a preservar a captação do rio Santa Maria, que abastece a Serra. O assunto vem recebendo resistência após vereadores criticarem a iniciativa, apontando que a cidade estaria recebendo passivos ambientais e imobiliários da capital sem ter sido devidamente consultada.
A Águas de Reúso de Vitória pertence à multinacional GS Inima, que venceu o leilão da Cesan para a construção e operação de uma Estação de Produção de Água de Reúso (EPAR). O projeto prevê receber o esgoto que atualmente é direcionado à Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) de Camburi, reciclar o material e vendê-lo como água de reúso industrial para empresas como ArcelorMittal e Vale. Essa mudança vai permitir a desativação da ETE de Camburi e, consequentemente, a liberação de uma das áreas mais nobres da capital.
A coluna procurou a Águas de Reúso de Vitória, que está no centro do descontentamento entre setores da Prefeitura e da Câmara da Serra. Segundo informou a empresa, atualmente o projeto encontra-se em fase de licenciamento ambiental e assim que for liberada as obras devem ser concluídas em 24 meses.
Escolha do local: Serra
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A área definida para a construção da EPAR está localizada em São Geraldo, na Serra, próxima ao Fórum Cível, em um terreno doado pela ArcelorMittal em 2022. Sobre a escolha do local — um dos pontos questionados por lideranças da cidade — a Águas de Reúso de Vitória afirmou que a localização da EPAR foi definida “de forma clara” no edital público realizado em 2024, no qual a empresa saiu vencedora do processo licitatório. Ou seja, a empresa informa que a construção da EPAR em São Geraldo já estava prevista muito antes de vencer o leilão para execução do serviço.
Segundo defendeu a concessionária, a escolha por São Geraldo teve como base critérios de logística e viabilidade operacional. “Além disso, vemos na Serra o potencial para se tornar referência global em reúso de água, com uma tecnologia inovadora e sustentável. A instalação da sede em São Geraldo trará benefícios diretos para a comunidade, como geração de empregos, renda e desenvolvimento local, marcando um avanço importante para a cidade no cenário ambiental e tecnológico”, destacou.
Relação com a comunidade de São Geraldo
O Jornal Tempo Novo questionou se houve contato prévio com a comunidade local de São Geraldo e adjacências para apresentação e debate do projeto. A empresa afirmou que mantém um diálogo “próximo e respeitoso com a comunidade de São Geraldo” e reconhece “a importância de sua participação”. Informou também que foi criado um comitê local de interlocução, que representa os moradores.
“Realizamos reuniões para ouvir dúvidas, sugestões e preocupações, o que é legítimo. Como parte desse processo de escuta e transparência, levamos representantes da comunidade para visitar uma planta similar, o Aquapolo, em São Paulo, onde puderam conhecer a tecnologia de perto e ver que a operação é segura, silenciosa e livre de odores. Seguiremos comprometidos com uma comunicação aberta e contínua com todos os envolvidos”, disse a empresa em nota.
Outra preocupação local é o traçado da tubulação que vai conectar o esgoto da ETE de Camburi à futura EPAR. A empresa afirmou que está seguindo o que foi estipulado no edital e, neste momento, o projeto passa por ajustes técnicos. “O objetivo é garantir o detalhamento necessário para evitar interferências com a infraestrutura urbana já existente.”
Empresa diz que projeto trará benefícios no abastecimento de água
A EPAR terá capacidade de produzir 391,5 litros por segundo de água de reúso — volume suficiente para atender cerca de 172 mil pessoas. Vale e ArcelorMittal são as duas maiores consumidoras individuais de água da Grande Vitória e, como serão beneficiadas pela EPAR, a empresa defende que a operação vai reduzir a captação direta do rio Santa Maria por parte da indústria.
“Isso representa um avanço importante na preservação dos recursos hídricos da região. Com essa economia, mais água do rio poderá ser direcionada ao abastecimento da população por meio da ETA Carapina, garantindo um uso mais sustentável e estratégico da água, essencial para o crescimento e qualidade de vida na Serra.”
A Águas de Reúso de Vitória ressaltou que ampliar as fontes de abastecimento é “essencial para acompanhar o crescimento acelerado da Serra — que, segundo o Censo de 2022, teve um aumento populacional de 24,76% desde 2010 — garantindo água para o desenvolvimento urbano e industrial do município.”
A empresa sustenta que a estação a ser construída na Serra será altamente eficiente, produzindo água de qualidade “extremamente elevada”, conhecida como água desmineralizada, ideal para processos industriais. Essa qualidade assegura confiabilidade e sustentabilidade ao abastecimento do setor produtivo.
Esgoto não aproveitado vai voltar para natureza
Além disso, informou que a água não aproveitada será devolvida ao estuário de Vitória, mesmo local onde hoje é lançado o efluente tratado da ETE de Camburi. Quanto aos resíduos sólidos gerados, serão encaminhados a uma empresa parceira da Região Metropolitana da Grande Vitória, que os transformará em adubo para uso agrícola.
Iema se posiciona
No âmbito do Estado, o órgão licenciador é o Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). A coluna procurou o instituto para se posicionar. O Iema confirmou que recebeu os requerimentos de licença prévia e de instalação para a Estação de Produção de Água de Reúso (EPAR).
“O processo passou por análise administrativa, quando se confere se a documentação está completa, e foram solicitadas complementações, entre elas, o mapeamento do traçado previsto. Dentre a documentação apresentada, constam manifestações das prefeituras de Vitória e da Serra. Neste momento, o Instituto aguarda a resposta da empresa, que ainda dispõe de prazo”, informou.
O órgão explicou que, devido ao porte e ao tipo de atividade prevista para o empreendimento, não há necessidade de EIA/RIMA (conjunto de estudos e documentos exigidos no licenciamento ambiental de empreendimentos com significativo impacto ambiental). Nesse caso, é exigido o Relatório de Controle Ambiental (RCA), instrumento mais simples que o EIA/RIMA. “Portanto, até o momento, não estão previstas audiências públicas, mas, caso sejam necessárias, poderão ser marcadas reuniões posteriormente.”
O Iema informou que a classificação do empreendimento é de potencial médio e porte grande, o que o enquadra na Classe III. Isso significa que a EPAR é classificada como de grande capacidade e que os impactos ambientais previstos não são pequenos, mas também não chegam a ser tão significativos quanto os de projetos que exigem EIA/RIMA.
“Após toda a validação documental, o processo seguirá para análise técnica. A partir daí, o Iema tem o prazo legal de 120 dias para conclusão da análise e emissão da manifestação definitiva, suspendendo-se esse prazo caso seja necessário exigir complementações técnicas”, concluiu o instituto.